quarta-feira, 30 de abril de 2008

terça-feira, 22 de abril de 2008

Boca de Rua na internet

Quem acompanha o trabalho do Boca de Rua pode agora ler na internet mais matérias e entrevistas feitas pelos moradores de rua. O Boca agora tem um blog.
A última edição rendeu muito mais textos e entrevistas do que poderia ser publicado no jornal impresso, por causa do limite de folhas por edição. Assim, surgiu a idéia de criar um blog, em que as entrevistas utilizadas nas matérias são disponibilizadas na íntegra, bem como poesias e outros escritos que precisaram ser cortados no processo de edição.
Para os que apreciam a outra visão dos problemas da cidade propiciada pelo jornal, e para os que têm críticas, eis um espaço para comentários e discussões.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Juízo











Assistam a Juízo, um filme de Maria Augusta Ramos.


Eu ainda estou digerindo, sem saber direito o que pensar.




Assisti ao filme-documentário ontem, na pré-estréia, com direito a debates-discursos depois. Algumas falas interessantes, uma sofrível, do representante da OAB/RS. A diretora declarou que o que pretende é que o filme seja um soco no estômago. Para mim foi - e me levou às lágrimas.




Veja o trailer aqui.




Depois disso, quero ver que âncora de televisão imbecil vai dizer que a FASE parece colônia de férias, cheia de atrativos, video-games e diversões.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Ainda sobre o constrangimento

Recebi hoje, por e-mail, um texto escrito pela socióloga e advogada Ana Paula Motta Costa, ex-presidente da Fase e da Fasc, participante do Fórum RBS que aconteceu na última terça-feira.
Eis o que ela diz:
"Constrangimento...
No último dia 2 de abril, participei junto com outros oito convidados de debate promovido pela Rede RBS sobre o tema do “constrangimento gerado pelos moradores de rua aos cidadãos”. De lá para cá, venho pensado sobre a experiência e os fatos ocorridos no debate, o que me faz trazer algumas questões para a reflexão. Parto do seguinte questionamento: o que, em toda a temática, deve causar constrangimento?
Penso que o constrangimento real e concreto é o fato de vivermos em uma sociedade em que muitas pessoas são submetidas a circunstâncias de vida sem a mínima dignidade, a tal ponto de ir para as ruas das cidades mendigarem ou buscar a sobrevivência diária, da forma em que esteja a seu alcance.
Constrangimento é ouvir o Subcomandante da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, Cel. Mendes, dizer que recolhe pessoas, como se fossem lixo, e as leva sem o menor critério, visto que “são um saco de gatos”, para um quartel da Brigada Militar, mantendo-as privadas de liberdade por algumas horas. Trata-se, portanto, de uma autoridade pública de nosso Estado, que prende pessoas, sem estarem em flagrante delito e sem ordem judicial, pelo simples fato de estarem nas ruas. Como se criminalizar a pobreza estivesse no âmbito da sua absoluta discricionariedade, ou no espaço de poder que lhe está delegado institucionalmente.
Constrangedor é ouvir o juiz de direito Felipe Keunecke de Oliveira, responsável por uma Vara Criminal da Capital, dizendo que a solução para a criminalidade, ou para a pobreza, pois não necessariamente se estivesse tratando de crimes, é a construção de presídios. Visto que o “problema da sua própria atividade jurisdicional” estaria no constrangimento de ter que prender e não ter onde, ou ter que escolher entre autores de crimes de ameaça e latrocidas...
Constrangimento é observar a pressão a que foi submetida a única convidada do debate que trabalha junto à população de rua, Iara Ramos, como se ela, ou organização não-governamental que ela representa, é que estivessem equivocadas ao tratar as pessoas em situação de rua como “seres humanos”.
Parece que estamos vivendo um momento no Estado bastante constrangedor... As instituições e autoridades são capazes de ir aos meios de comunicação expressando-se como se não estivéssemos em um estado democrático de direito, onde existe uma Constituição que há quase vinte anos prevê diretos individuais, como o direito de ir e vir, para “todos os cidadãos”, além de diretos sociais, os quais devem ser tratados com força normativa e institucionalizante de uma ordem social capaz de garantir a dignidade humana.
Parece que temos muito a caminhar no sentido do desvelamento do pré-conceito que fecha os olhos das pessoas frente à humanidade de outras pessoas. A indiferença faz com que se sinta constrangimento frente ao invisível, que só ganha visibilidade quando faz aflorar as contradições sociais, que se prefere estejam escondidas.
Conforme refere Zigmunt Bauman, a sujeira só é sujeira dependendo do lugar em que ela se encontra. E exemplifica: o sapato pode estar limpo, se estiver no pé ou no chão. Se estiver em cima da mesa, por mais limpo que esteja, está fora de lugar, e representa a sujeira.
As pessoas que estão em situação de rua só “são consideradas lixo”, por quem as entende assim, e na medida em que estão “fora de lugar”, ou seja, se estiverem invisíveis à sociedade formal, presas ou encarceradas nas periferias, talvez não causem constrangimento..."

(Ana Paula Motta Costa)

E ainda há o ótimo artigo do Moysés, publicado na ZH de hoje (e postado no blog dele). Pelo menos deram um pequeno espaço para as vozes discordantes.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Só o que queremos é não nos sentirmos constrangidos?

A Zero Hora publicou hoje o resultado de uma pesquisa que questionou 601 pessoas de "diferentes bairros e classes sociais" sobre o sentimento delas em relação às pessoas que pedem dinheiro nos sinais. O resultado apontado é que 69% dos entrevistados se sentem incomodados pela abordagem dos "pedintes", 11,8% acham que a maneira de agir dos "pedintes" é agressiva e os faz sentir como se fossem assaltados. Além disso, 40,3% dos entrevistados acha que quem pede ajuda no sinal, na verdade, tem preguiça de trabalhar e escolhe o caminho mais fácil. E 40,9% acham que a maioria das pessoas que vivem nas ruas são ladrões.
Estes resultados serviriam como base para o painel RBS que ocorreu na manhã de hoje, com mediação de Lauro Quadros (!) e participação de nove especialistas, que debateram o tema "Constrangimento nas ruas - Até onde vai esse problema?".
Diz o editorial da ZH: "O ponto de partida é a pesquisa de percepção de moradores e freqüentadores da cidade sobre a relação diária com pessoas que pedem ou mesmo tentam extorquir". Nota-se então que a Zero Hora em nenhum momento considera os moradores de rua como moradores e freqüentadores da cidade, justamente eles, que por não terem casa, freqüentam e vivem a cidade muito mais do que nós, constantemente trancafiados em nossas casas e carros.
O problema, para o grupo RBS e para grande parte dos habitantes de Porto Alegre, não são os motivos que levam as pessoas a pedirem dinheiros no sinal, dependendo da boa-vontade alheia, passando fome até conseguir juntar um dinheiro, sendo ignoradas por muitos, que fingem que não as vêem, sendo insultadas por outros. O problema é o constrangimento que esses moradores de rua causam a nós, que não queremos que essas pessoas estraguem nossos dias ao nos lembrarem que a pobreza aumenta e há cada vez mais moradores de rua. Se elas ao menos ficassem quietas, paradas, sem encostar nos nossos carros, sem pedir "uma moedinha pra comer, cinco centavos, dez centavos, qualquer coisa pelamordedeus", talvez não incomodasse tanto. O que precisa ser debatido, para a RBS, é como acabar com o constrangimento que eles nos causam - não como fazer que menos pessoas precisem morar nas ruas, seja por não terem casa, seja por ser melhor estar na rua do que em casa - imaginem então que casa é essa.
Na pequena matéria publicada no site da ZH sobre o debate, o juiz criminal do Fórum Regional da Zona Norte Felipe Keunecke de Oliveira ressalta que é preciso distinguir quem está na sinaleira ou quem pede para roubar dos que querem constranger a população. É absurdo pensar que é fácil passar horas parado no sol, na chuva ou no frio, sentindo o desprezo e o medo dos motoristas, para juntar alguns reais. É absurdo pensar que alguém faria isso apenas para causar constrangimento!
A pesquisa não informa ter entrevistado nenhum morador de rua. Dentre os nove convidados para o debate, não há nenhum morador de rua e apenas uma das "especialistas", Iara da Rosa, da Casa de Convivência II, trabalha de fato com a população de rua. Não interessa a ninguém saber o que pensam aqueles que pedem dinheiro nos sinais? Não interessa a ninguém escutar seus motivos, as dificuldades que enfrentam, como são tratados? Por que não se dá espaço para que essas vozes sejam ouvidas?
Estranho seria se a maioria dos entrevistados não se sentisse mais constrangida por pessoas pedindo dinheiro, se todos estivéssemos tão acostumados em enxergar a pobreza que ela não conseguisse nos abalar mais. O constrangimento que sentimos deveria nos fazer pensar sobre a maneira de tratar os moradores de rua, sobre o que eles sentem e como eles enxergam a situação em que vivem. É incrível que o que esteja problematizado seja o que eles causam na vida da classe média e não as causas de cada vez mais pessoas estarem à margem da sociedade.
Embora muitos finjam que os moradores de rua são invisíveis, eles ainda incomodam e só o que ser quer é que eles saiam do nosso campo de visão.