Na última segunda-feira, 24 de março, foi lançada a terceira edição da
revista Norte - cultura no sul do mundo (e eu já gostei do nome), em que gaúchos escrevem sobre literatura, cinema e artes plásticas, entre outras coisas. É uma revista magrinha, com um projeto gráfico bonito e matérias interessantes, e custa apenas R$ 3,50.
Dentre as matérias, a revista publicou o primeiro capítulo de um folhetim que está sendo escrito por seis prostitutas de Porto Alegre vinculadas ao Núcleo de Estudos da Prostituição (NEP). "Mariposa - uma puta história" é uma narrativa ficcional sobre a vida de Fran, personagem inventada misturando características da personalidade e pedaços da vida de cada uma das autoras. Como elas mesmo dizem na introdução, quem ler vai ficar "sabendo que não é verdade que prostituta não vale nada e não tem vergonha de nada".
A revista Norte já ganhou meu respeito pela iniciativa de abrir espaço para que as prostitutas falem, através da ficção, sobre como elas vivem, sobre os problemas e os aspectos positivos da sua profissão, sobre a discriminação de que são alvo. São elas mesmo mostrando como enxergam o mundo, e não alguém contando a história por elas, fazendo reportagens em que elas são apenas as fontes. É um projeto com o objetivo de fazer que vozes que nunca são ouvidas pelos meios de comunicação encontrem um espaço de manifestação. É uma tentativa de modificar alguns olhares preconceituosos, mostrando que a palavra prostituta não resume tudo o que uma pessoa é. Em Porto Alegre, são cerca de 10 mil mulheres que, além de trabalharem como prostitutas, têm famílias, sonhos, histórias sofridas ou nem tanto, assim como todo mundo.
O folhetim surgiu em oficinas de escrita coordenadas pela jornalista Rosina Duarte (minha querida chefe/colega) e pela psicóloga Maíra Brum Rieck, que se perguntavam: "o que aconteceria se essas pessoas fossem ouvidas, não na condição de marginais, de quem está do lado de fora, mas a partir do seu próprio ponto de vista? O que aconteceria se deslocássemos, ainda que levemente, o ângulo da nossa visão? O que aconteceria se escutássemos o que elas têm a dizer? "
São as mesmas questões que motivaram o surgimento do Boca de Rua e que, acredito eu, deveriam inspirar todos os veículos de comunicação comunitária.